Núcleo de Estudos da UFSC mantém viva a cultura açoriana em Santa Catarina
Um projeto desenvolvido há quatro décadas na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) vem preservando, valorizando e divulgando a cultura de base açoriana presente nos municípios da região litorânea do Estado. A iniciativa conta com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu).
“A Fapeu é muito importante no processo de execução porque a sua atuação no acompanhamento financeiro dá muito mais tranquilidade aos coordenadores das atividades”, relata o coordenador do projeto, Francisco do Vale Pereira. “Com o apoio da Fapeu, o projeto se realiza de forma tranquila, fácil e bem assessorado. O acompanhamento de pessoas treinadas e capacitadas para as questões financeiras tem sido fundamental”, acrescenta Vale Pereira, historiador da Secretaria de Cultura, Arte e Esporte (SeCArtE) e coordenador do Núcleo de Estudos Açorianos (NEA) da UFSC.
O projeto “Assessoria às Comunidades de Base Açoriana de Santa Catarina” é uma atividade de extensão universitária desenvolvido pelo NEA. O núcleo foi criado em 1984 com o objetivo de realizar pesquisas sobre a presença da cultura açoriana no Estado, que foi trazida pelos colonizadores vindos do Arquipélago dos Açores em meados do século 18, notadamente entre os anos de 1748 e 1756.
TRABALHO COMUNITÁRIO
Em 1992, o NEA foi reestruturado e, além de seguir como um polo de pesquisa e investigações sobre a cultura açoriana em Santa Catarina, passou a dirigir suas ações ao trabalho com as comunidades da costa catarinense por meio de prefeituras, fundações e associações culturais, grupos folclóricos e instituições de ensino.
“Hoje, temos um trabalho comunitário que atinge todo o Litoral de Santa Catarina com cursos, palestras, mapeamento cultural e formação continuada para professores. Também criamos a Festa da Cultura Açoriana (Açor), na qual podemos mostrar o que temos de mais significativo e autêntico dessa herança cultural, e implantamos um Conselho Deliberativo formado por representantes das instituições culturais e prefeituras do Litoral catarinense”, conta o coordenador do projeto.
CAPACITAÇÃO
A Festa da Cultura Açoriana de SC (Açor) em 2024 está na 30ª edição. Além da Açor, o NEA também realiza o Troféu Açorianidade, que anualmente é entregue a pessoas e instituições que preservam, divulgam e promovem a Cultura de Base Açoriana de SC. Em 2024, Biguaçu foi escolhida para sediar os dois eventos.
Os preparativos para a Açor começam ainda no início do ano, quando é realizada uma capacitação de professoras e professores da rede de ensino do município sede da festa. Na capacitação são ministrados conteúdos relacionados ao Arquipélago dos Açores, às tradições e heranças culturais de Santa Catarina, à história e aspectos culturais do município, entre outros assuntos. “Fazemos as pesquisas, valorizamos as identidades culturais locais e, principalmente, devolvemos à comunidade esses resultados. Com isso, estamos valorizando as raízes açorianas no nosso Estado”, observa Vale Pereira.
GOVERNO DOS AÇORES
O projeto é financiado pelo Governo Regional dos Açores, por meio da Direção Regional das Comunidades, que é um órgão de assessoria às comunidades açorianas espalhadas pelo mundo. “A nossa cultura litorânea catarinense tem significativas características herdadas de habitantes do Arquipélago dos Açores, que, quando para cá vieram, trouxeram seus saberes e fazeres. Destacamos as tecnologias dos engenhos de fabricar farinha de mandioca, que impulsionou a produção dessa farinha oriunda da cultura indígena, as festas populares e religiosas em Louvor ao Divino Espírito Santo, a santas e santos; os nossos hábitos alimentares com frutos do mar, como ensopados, caldos, assados de peixe; o cozido à portuguesa; além de danças folclóricas com o pau de fitas; a dança do Pezinho e a roda de ratoeira; e a dança da chamarrita”, enumera o historiador.
Entre as festas populares e religiosas, o coordenador do Núcleo de Estudos Açorianos cita a Festa de Nossa Senhora da Lapa, no Ribeirão da Ilha, em Florianópolis, a Festa de Nossa Senhora da Penha e a Festa do Mastro de São Sebastião (ambas em Penha, no Centro Norte do Estado), a Festa do Senhor Bom Jesus de Araquari e a Festa de Nossa Senhora do Rosário e Catumbi, ambas em Araquari, no Norte do Estado; e Festa do Senhor Bom Jesus dos Passos, em Imaruí, no Sul. E ainda as Festas do Divino Espirito Santo em Bombinhas, Porto Belo e Barra Velha, entre outras.
Atualmente, o NEA/UFSC atua em parceria com 48 municípios do Litoral catarinense, numa área de 15 mil quilômetros quadrados e envolvendo uma população de aproximadamente 1,5 milhão de habitantes. “Esse projeto é desenvolvido com participação local: visitas aos municípios e instituições que solicitam apoio e ajuda ao NEA. Promovemos palestras, debates, cursos de formação continuada para a rede de ensino nos municípios; assessoramos e apoiamos inciativas de associações e instituições culturais com indicações bibliográficas, promovendo exposições itinerantes com a temática da herança açoriana”, relata Vale Pereira.
COLONIZAÇÃO
A colonização açoriana em Santa Catarina foi deflagrada em 31 de agosto de 1746, quando o Rei D. João V, de Portugal, assinou uma Resolução Régia que abriu o processo de inscrição para casais interessados em embarcar para o Brasil Meridional.
A estimativa é que, entre os anos de 1748 e 1756, mais de 4,5 mil açorianos, provenientes principalmente do grupo central do Arquipélago dos Açores (Ilhas Terceira, Pico, São Jorge, Faial e Graciosa) fixaram residência no Litoral catarinense e outros 1,5 mil, no Rio Grande do Sul.
Para se ter uma ideia do que representou aquele grupo de 4,5 mil açoarianos, àquela época a então Nossa Senhora do Desterro (atual Florianópolis) recém havia sido elevada à categoria de vila, mais exatamente em 1726, desmembrada de Laguna. Foram eles que, em março de 1748, 70 anos após a chegada do fundador Dias Velho, estabeleceram às margens da Lagoa da Conceição a primeira colônia de portugueses açorianos no Estado.
A segunda colônia formou-se em Santo Antônio de Lisboa e mais adiante surgiram outras na região continental: em São Miguel (Biguaçu), São José de Terra Firme, Enseada de Brito (Palhoça) e em Vila Nova, local onde hoje se encontra Imbituba.
E foi assim que aqui eles deixaram suas marcas para sempre – perpetuadas em trabalhos como o realizado pelo NEA da UFSC. “Preservar é oportunizar identidade e cidadania. Preservar é fazer a pessoa se sentir integrada à comunidade onde vive, sabendo por que e como vive daquela maneira, e com aqueles costumes. Buscar a identidade familiar e cultural é um desejo das pessoas, como forma de se sentir pertencente àquela comunidade. Então preservar essa Identidade Cultural de Base Açoriana é oportunizar às pessoas a sua inclusão social e cultural”, define o coordenador do NEA, Francisco do Vale Pereira.
Saiba mais informações sobre o projeto e tenha acesso aos acervos do Núcleo de Estudos Açorianos em www.nea.ufsc.br
PROJETO: ASSESSORIA ÀS COMUNIDADES DE BASE AÇORIANA DE SANTA CATARINA/ COORDENADOR: Francisco do Vale Pereira / kikodovale@hotmail.com / UFSC / Secretaria de Cultura, Arte e Esporte da UFSC (SeCArtE) / Reitoria / Mais informações em www.nea.ufsc.br
* Esta reportagem faz parte da edição 15 da Revista da Fapeu que está disponível na íntegra para download em https://tinyurl.com/RevistaDaFapeu