Projeto revoluciona a produção de vinhos e uvas de Nova Trento
Um projeto desenvolvido pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) está revolucionando a vitivinicultura de Nova Trento, município do Vale do Rio Tijucas conhecido pela cultura italiana e pelo turismo religioso relacionado ao santuário de Santa Paulina.
Coordenado pelo professor Alberto Fontanella Brighenti, do Centro de Ciências Agrárias (CCA) da UFSC, o trabalho é executado em uma propriedade localizada na comunidade de Vígolo e conta com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu). “A Fapeu é essencial para que seja possível a realização do projeto. A gestão dos recursos é realizada pelos profissionais da Fapeu, o que permite aos pesquisadores maior liberdade para executar o trabalho de pesquisa e extensão”, ressalta o coordenador da iniciativa, Alberto Fontanella Brighenti. O projeto ainda tem apoio da prefeitura de Nova Trento e a parceria do viticultor Ricardo Cipriani, empresário do ramo da fruticultura e egresso do curso de Agronomia da UFSC.
Apesar das origens italianas e de ser uma tradicional região produtora de vinhos, quase a totalidade da produção vinícola local é feita de uvas recomendadas para vinhos de mesa, com grande parte da matéria-prima oriunda do Rio Grande do Sul. Além da carência de conhecimento técnico atualizado entre os viticultores sobre práticas modernas e técnicas mais sustentáveis de produção, assim como de infraestrutura adequada para sustentar a expansão e modernização da cultura na região, outro grande adversário é o clima.
“No início do projeto, em 2020, havia uma série de dúvidas, como ‘seria possível produzir uvas viníferas sob cultivo protegido na região de clima subtropical?’; ‘essas uvas teriam qualidade adequada para vinificação?’; e, por fim, ‘os vinhos produzidos teriam um padrão de qualidade?’”, lembra o professor Alberto Brighenti.
Hoje, quatro anos depois, a produção tornou-se comercial, com lançamento de marca própria (O Herege), que conta com um espumante elaborado com a variedade Chardonnay e um vinho rosé, a partir de uvas Marselan. O primeiro passo, além das questões técnicas, foi enfrentar o clima subtropical úmido, propício para a disseminação de doenças fúngicas que afetam variedades viníferas menos adaptadas à região. “Em quatro anos de avaliações e três ciclos produtivos foram testadas uma dezena de variedades, diferentes estilos de vinificação e diferentes produtos. É possível pontuar que a variedade vinífera Marselan apresenta uma boa adaptação ao cultivo protegido em região subtropical. Os espumantes da variedade vinífera Chardonnay também apresentam boa qualidade. Dentre as variedades destinadas ao consumo in natura, a Niágara Rosada aparece como uma boa opção, porque sua colheita é realizada precocemente, o que permite um bom retorno financeiro”, relata o professor Brighenti.
CULTIVO PROTEGIDO
Para blindar a produção, foi adotada a técnica do cultivo protegido, que permite uma melhor manutenção da umidade ao vinhedo e resguarda as plantas dos danos e doenças provocadas por adversidades climáticas e fitossanitárias. “A cada ciclo produtivo, os parâmetros de avaliação e seus resultados têm se tornado mais sólidos. As consecutivas obtenções de dados possibilitam uma comparação de resultados fundamentada e segura para sustentar a adequação de técnicas e, consequentemente, contribuir para o desempenho do setor vitivinícola da região”, pontua o coordenador do projeto, que é desenvolvido a 78 metros de altitude. Agora, o grupo de pesquisa está testando o cultivo de variedades PIWI (Pilzwiderstandsfähige Rebsorten), híbridos que possuem genes de resistência a doenças fúngicas, como a Calardis Blanc. “A avaliação do desempenho de variedades resistentes na região é de grande importância, pois o seu estabelecimento torna possível a redução da aplicação de fungicidas e dos danos causados por essas doenças, promovendo uma viticultura mais sustentável e com menores custos para o produtor”, observa o professor Brighenti. “A dependência de variedades tradicionais é um fator limitante para a melhoria da qualidade dos produtos oferecidos ao mercado. Por isso destaca-se a importância da introdução de novas variedades, como as PIWI, capazes de adaptar-se às condições locais e reduzir custos e riscos com perdas por doenças fúngicas causadas pelo clima úmido”, acrescenta Brighenti.
NEUVIN
O projeto é acompanhado por técnicos e pesquisadores do Núcleo de Estudos da Uva e do Vinho (Neuvin). Outro resultado inédito já alcançado foi a implementação de duas colheitas por ciclo produtivo, resultado do ajuste do calendário de colheita e das podas produtivas e que resulta em maior produtividade das variedades.
A expectativa é que os resultados alcançados no local se espalhem por todo o município e região. “O estabelecimento de técnicas e tecnologias para viabilizar a produção de uvas viníferas nesse local pode estimular outros produtores a ingressarem nessa atividade, pode contribuir para a expansão da fronteira vitícola do Estado e, por fim, contribuir para a criação de novos empregos e de novas empresas neste ramo”, observa o coordenador do trabalho.
De acordo com o Censo Agropecuário de 2022, a produção total de uvas no município de Nova Trento é de 510 toneladas, relativa a uma área destinada à colheita de 30 hectares (ha), com um rendimento de 17.000 kg/ha. Em relação ao número de estabelecimentos agropecuários dedicados à produção de uvas para vinho ou suco, a informação mais recente é de 2017, quando havia 15 estabelecimentos com 50 ou mais videiras, com uma produção total de 239 toneladas, área total de 25 hectares destinados à colheita.
“Com base nos resultados obtidos, os produtores poderão ser apresentados à alternativa de produzir uvas viníferas sob cultivo protegido. Essa prática resultará em uma redução significativa de perdas causadas por intempéries, como granizo ou chuvas excessivas. Além disso, o cultivo protegido permite um manejo mais efetivo das doenças e a redução da aplicação de defensivos químicos, devido à diminuição da umidade no ambiente de cultivo”, observa o professor Brighenti.“Essa prática também viabiliza o reajuste do calendário de podas e colheitas, aumentando a produtividade do vinhedo”, acrescenta.
BONS RESULTADOS
A colheita de bons resultados é promissora. “A partir da adoção de novas técnicas de cultivo indicadas, os produtores locais alcançarão redução de perdas, aumento na produtividade e rentabilidade de seus vinhedos. Com produtos mais competitivos no mercado, o município se destacará pela qualidade e identidade regional de maneira a impulsionar o desenvolvimento do turismo e economia local”, projeta Brighenti.
E todos poderão degustar o doce sabor dos lucros do vinho e da uva. “Como resultado deste projeto, é possível gerar um impacto profundo e positivo na economia de Nova Trento, pelo aumento da produtividade, da qualidade da produção e pelo aumento de investimentos na área e consequente criação de empregos. De modo geral, o projeto não apenas melhora as condições de produção para os viticultores, mas também promove o desenvolvimento da região como um todo”, ressalta o professor.
Até a equipe participante do projeto ganha. Nos quatro anos de execução, a iniciativa já rendeu duas dissertações de mestrado e sete trabalhos de conclusão de curso. E atualmente são realizados uma tese de doutorado, três dissertações de mestrado e um trabalho de conclusão de curso na área. Isso tudo merece um brinde!
PROJETO: ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL EM VITICULTURA CICLO 2023-2024 / COORDENADOR: Alberto Fontanella Brighenti / albertobrighenti07@gmail.com / UFSC / Departamento de Fitotecnia / CCA / 12 participantes / Acompanhe os trabalhos no Instagram em @neuvin_ufsc e @oherege_vinhos
* Esta reportagem faz parte da edição 15 da Revista da Fapeu que está disponível na íntegra para download em https://tinyurl.com/RevistaDaFapeu